domingo, 30 de dezembro de 2018

POEMA SIMPLES POEMA SIMPLES (E INCOMPREENDIDO) A AFFONSO ÁVILA


POEMA SIMPLES
                                                                                  (E INCOMPREENDIDO) A AFFONSO ÁVILA


Não tive a honra e o prazer de conversar um minuto sequer com Affonso Ávila. Só com os poemas dele.
Quando lancei, em 2008, o livro-objeto "Carimbalas" (ao lado de Marcelo Dolabela, com o seu formidável "Carimbós"), feito todo e cada exemplar em
carimbos, o primeiro que pensei em presentear foi a ele.
Na época, sem favor, Affonso era um dos três mais importantes poetas vivos do Brasil - par a par com Augusto de Campos e Décio Pignatari (e Manoel de Barros, hein?).
Telefonei, superconstrangido, sem saber se o chamava de "senhor", de "poeta" ou de "você", mas, delicadamente, ele se mostrou sensivel à ideia do presente.
Talvez por trabalhar em TV durante muitos anos, as pessoas acham que sou um cara-de-pau.
Na verdade, estou mais para bicho-bobo, parvo e acanhado.
Não tive coragem de lhe entregar o livro pessoalmente.
Fui com uma amiga, que gentilmente aceitou o encargo, até à Rua Cristina, 1300, endereço do poeta.
Enquanto ela batia a campainha, levei o carro até a extremidade da rua.
Ele, que não era nada bobo, agradeceu o presente, mas ficou na porta da casa olhando - atentamente - ela se deslocar, talvez por cerca de 150 metros, até o carro.
Deve ter pensado, de forma correta:
- O cara é meio bobo, tá encondido dentro do carro"!
Nunca fiquei sabendo se leu, se gostou ou não de "Carimbalas."
Nem na morte (26/09/2012) me encontrei com Affonso Ávila. Cheguei atrasado ao enterro.
No pé do morro onde foi enterrado, no Parque da Colina, dei de cara com o amigo e escritor Carlos Herculano Lopes.
- Não adianta subir, já foi enterrado...
Triste, retruquei:
- Poetas não deveriam ser enterrados rigorosamente no horário!
Quando lancei, ano passado, a latinha-de-vaselina-de-poesia "CunilínguaPátria", 69 poemas em cartões, um dos textos foi um poema simples, falando, metaforicamente, da perda do grande poeta, a partir do endereço, Rua Cristina, 1300.
Creio que poucos tenham entendido.
Hoje, comparecerei à homenagem que será feita, no SescPalladium, aos 90 anos de nascimento do poeta.
Até o nome, poético, faz jus a ele, "O Jogo contra o Jugo."
Debate inteligente e instigante.
O Professor Antônio Sérgio Bueno (UFMG) e o poeta e professor Ronald Polito desnudaram aspectos importantes da poesia de Affonso.
Além do apuro e descoberta artística, também aliados à inserção social e política, o poeta se lambuza, deliciosamente, no humor e no erotismo.
Traço que se sobrepõe ao trabalho do irmão poético de Affonso, o genial Augusto de Campos, que se conteve, principalmente no erótico, nas delícias desse lambuzar.

                                                                                                                           CARLOS BARROSO

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